quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

“Isso não é nada”


Após todas as tentativas frustradas para me livrar do queloide, eu resolvi tentar conviver pacificamente com ele (aquele lance de “se não pode vencê-lo, junte-se a ele”). Não foi fácil. Eu sei quantas pessoas sofrem por não terem uma perna, um braço, por terem nascido com algum tipo de síndrome, ou cegas, surdas, mudas... ok! Eu sei que essas pessoas sofrem mais do que eu, que tenho “apenas uma cicatriz” no peito. Mas se já não é fácil para uma adolescente passar ilesa por essa fase, imagine uma adolescente que tem uma “salsicha no peito”. Uma adolescente que ouviu certa vez de um garoto: “que nojo! Por que você não trata dessa coisa?”. Ou então que era obrigada a conviver com os olhares de desconhecidos por onde quer que fosse...

O mais bizarro é que as pessoas se sentem no direito de invadir a sua vida e perguntar o que você tem. E eu não estou falando de pessoas próximas, que estudam ou trabalham com você. Não! Eu estou falando de desconhecidos no transporte público!
São tantas as histórias. As pessoas me paravam pra perguntar se eu havia feito cirurgia cardíaca, se eu tive broncopneumonia (!), me passavam receitas milagrosas para curar cicatrizes. E uma vez fui elogiada por um segurança do metrô pela minha “coragem de usar decote!”.

Eu me sentia uma alienígena (ainda me sinto, muitas vezes). Sério! Parece brincadeira, mas é verdade. Então, decidi usar o meu senso de humor para driblar o problema. Já que eu me sentia uma “alien” mesmo, então inventei a história de que minha cicatriz havia ocorrido após uma abdução alienígena. Aqueles “seres” me sequestraram e implantaram um chip no meu peito, através do qual é possível me rastrear aqui na Terra. Contei tantas vezes essa história que passei até a acreditar nela. Aliás, ela foi publicada na revista Maxim Brasil, na época em que a revisava.

                              Maxim Brasil ed. 11 (2009), pág. 67

Na verdade, era muito mais interessante contar a história inventada do que contar a verdade, que é “eu não sei como a cicatriz surgiu”. Um pouco de fantasia faz bem...

Difícil convivência
Certa vez, em entrevista à revista TPM, a lindíssima Malu Mader relatou o drama que ela passou aos 25 anos ao saber que tinha um tumor atrás do fígado. Ela precisou fazer uma cirurgia para retirá-lo, descobriu que não era câncer, mas ficou com uma cicatriz na barriga por conta da cirurgia.
Na entrevista ela disse que a princípio sua convivência com a marca foi complicada, mas com o tempo ela se acostumou, e nunca fez uma cirurgia plástica para tentar retirá-la, porque, como ela disse: “a cicatriz já era minha – aquilo vai se integrando, a marca vira tua”. Por outro lado, ela afirma que até hoje não usa biquíni em público, porque sabe que as pessoas vão ficar olhando.

É assim que eu me sinto. Por mais que haja momentos de compreensão, o tal do “isso não é nada”, sempre há um constrangimento por eu não ser “normal” esteticamente.
Às vezes eu paro pra pensar e parece que estou fazendo um drama por nada. E sei que se você está lendo este blog e não tem uma marca como a minha, está pensando a mesma coisa. Mas não é bem assim. Não é fácil conviver com o queloide. Não é fácil... Além da parte estética, que incomoda, sim, e muito, tem o lance da dor, da coceira... Não é tão simples ou um drama superficial como aparenta.
Algumas pessoas que me conhecem devem estar se surpreendendo com esses relatos. Porque na maior parte do tempo eu não demonstro o meu incômodo com as cicatrizes. Como disse, sempre levo na base do humor. Rir dos meus problemas sempre foi a forma que encontrei de me proteger deles. E com as cicatrizes é a mesma coisa.

Apenas quem me conhece mais profundamente sabe o quanto essas marcas me incomodam. E escrever aqui é também uma forma de me aceitar melhor. Se para mim é difícil sair com uma blusa decotada ou então sem um colar para tentar disfarçar as cicatrizes, imagina o quão difícil é falar abertamente sobre isso aqui. Mas este é o primeiro passo para a minha aceitação pessoal. Como diz o título do blog, EU SOU MAIS QUE UMA CICATRIZ, e é isso que vou provar a mim mesma a cada dia! 

FELIZ 2012 A TODOS! QUE O ANO QUE VEM DEIXE MUITAS MARCAS DE ALEGRIA EM CADA UM DE NÓS!

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Uma nova esperança


Sempre penso que se o homem já foi até para a Lua (há controvérsias, mas ok. Digamos que tenha ido), não é possível que algum dia não vão inventar “a cura do queloide”. Há tantos procedimentos estéticos hoje em dia... Tá gorda? Faz uma lipo. Descontente com o tamanho dos seios? Silicone tá super na moda. Outro dia fiquei surpresa – ou melhor, eu fiquei aterrorizada – quando soube de uma cirurgia que quebra os ossos da perna para que a pessoa ganhe uns 4 ou 5 centímetros a mais de altura! Com tudo isso que já inventaram, não é possível que uma “coisinha tão simples” quanto o queloide não tenha solução!
Mas depois de tanto tempo de luta, parece que eu encontrei uma luz no fim do túnel...

Hoje me consultei com o Prof. Dr. Bernardo Hochman, especialista em queloides. Após mais de uma hora de conversa (que para mim foi uma verdadeira aula!) eu saí da clínica com uma nova visão do meu caso. Que atendimento excepcional! Eu ficava lá ouvindo o doutor falar e pensando: “por que eu não ouvi tudo isso antes de fazer a cirurgia?”.
Acho que a resposta certa é porque cada coisa tem o seu tempo. E eu acho que agora estou no momento certo de começar esse novo tratamento. Não vai ser fácil. Vou fazer um verdadeiro ritual diário. Além disso, vou fazer mais uma infiltração, que já está marcada para o dia 11/1/2012... ai, ai, ai. Mas o doutor me garantiu que não vou sentir dor, pois ele aplica anestesia local antes da infiltração. Ufa!

Nervos à flor da pele
Eu não tenho condições de repassar a vocês a aula que tive com o doutor Bernardo Hochman hoje. Mas muitas das coisas que ele me disse eu não vou esquecer. Uma delas é a seguinte: normalmente, as cicatrizes “normais” têm bem menos nervos do que a pele sem cicatriz. No caso do queloide (que hoje também fiquei sabendo que é um tumor benigno), a quantidade de nervos é bem maior que na pele normal. É por isso que há tanta sensibilidade nessa área. Faz sentido...
Outra coisa: tomar sol está proibido! Não posso sair ao sol com a região com os queloides exposta. A partir de hoje minhas camisetas básicas da Hering vão voltar a ser uniforme! E caso eu insista nesse erro, preciso usar filtro solar (oil-free) no mínimo com fator 50, e repassá-lo quatro vezes ao dia. Usar correntinhas para disfarçar o problema também está fora de cogitação! Esse hábito agride ainda mais a pele que já está ferida. Oh, God! Fiz tudo errado a vida toda!
A coceira que sinto é causada por falta de hidratação. Para hidratar o queloide eu posso continuar usando o Kelo-Cote ou então o creme Neutrogena Body Care.

O novo tratamento

Vou falar um pouco de como vai ser o meu ritual diário a partir de agora.
Serão 9 comprimidos diários que vou precisar tomar. Três desses remédios são manipulados. Um deles eu vou tomar para sempre, 3 comprimidos em jejum (Proepa – Ômega-3). Este remédio não tem contraindicação, ele é vendido mesmo sem receita, por isso é o único que vou citar, tanto por segurança quanto para não prejudicar o trabalho do dr. Bernardo Hochman, que é responsável pelo meu tratamento, e não por quem resolver se aventurar sem consulta médica.
Além dos remédios vou usar um creme de capsaicina na região dos queloides (também feito por manipulação! Não use sem recomendação médica), lavar a área com sabonete de enxofre, hidratar com os produtos que já mencionei pelo menos 3 vezes ao dia e o que eu acho que será mais incômodo: vou dormir com placas de silicone feitas sob medida e uma malha compressora (que realmente comprime! Acho que vou morrer de calor, mas tudo bem...).
Isso é o que vou fazer em casa. Na clínica, vou começar com a infiltração. Depois será feita a limpeza da pele com microcristais e por fim um tratamento Fono+ Eletro (10 sessões, sendo as 6 primeiras 2x por semana, e as 4 últimas 2x por mês).
No dia da infiltração vou passar também com uma nutricionista, que fará um trabalho conjunto.
Bom, acho que é SÓ isso. Já encomendei o ômega-3 para começar a tomar ainda esta semana. Os outros medicamentos, por serem manipulados, só serão feitos na primeira semana de janeiro (ou seja, semana que vem).

Vou mantê-los atualizado sobre a evolução do tratamento. Só posso dizer que estou bem animada e esperançosa. Eu sei que as cicatrizes não vão desaparecer, mas se ficarem mais discretas já será maravilhoso! Fiquem na torcida!

(Em tempo: eu super-recomendo a clínica do Prof. Dr. Bernardo Hochman! Entrem no site e conheçam mais: http://www.queloide.com.br/)

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

E o que já era difícil...

Quantas vezes a gente solta a esmo a frase “pior do que está não fica”? Não, não vou falar sobre a candidatura do Tiririca, que também usou esse bordão. Acontece que por anos eu acreditei que minha cicatriz não ficaria pior do que já estava após a cirurgia.
De fato, a cicatriz em si continua igual. Hoje, seis anos após a cirurgia, ela está “calma”, ou seja, não sinto mais dor nem coceira, e acredito que ela não vá mais aumentar. Porém, no final de 2009, após resolver parar de tomar anticoncepcional por conta de alguns efeitos colaterais indesejáveis, tive uma brusca alteração hormonal, o que me causou centenas (!) de espinhas, tanto no rosto quanto no tórax e nas costas. Uma mulher de 26 anos tomada por acnes. Que beleza!
Antes de saber que o que eu tinha era uma alteração hormonal (o que só foi descoberto em janeiro de 2011), passei em algumas dermatologistas, que simplesmente me passavam alguns creminhos para usar nas espinhas, mas obviamente eles não resolviam nada.
Certa vez me consultei com uma dermatologista que disse que a única solução para o meu caso seria tomar Roacutan. Mas ao mesmo tempo em que ela me falou sobre esse remédio, que na hora eu pensei que seria a solução de todos os meus problemas, ela começou a me assustar de um jeito que parece mentira. A seguir, algumas frases animadoras ditas por essa dermatologista: “Você vai ficar TODA seca. Tudo que é mucosa vai secar: olhos, boca, vagina; você não pode engravidar de jeito nenhum, porque caso isso ocorra, seu filho vai nascer defeituoso, então, você precisa voltar a tomar anticoncepcional; é possível que você tenha hepatite medicamentosa se tomar outro remédio com o Roacutan; pode ser que seu cabelo caia bastante”, etc., etc., etc... Conclusão: não tomei o bendito remédio.
Foi então que me consultei com uma endocrinologista, que foi a primeira a me pedir um exame de sangue completo, inclusive das taxas hormonais. E ela descobriu a alteração. Estava com excesso de hormônios masculinos, o que estava causando todas as espinhas.
Em fevereiro deste ano comecei a tomar Espironolactona 50 mg e Prednisona 2,5 mg todas as noites. O resultado não foi imediato, mas as espinhas melhoraram bastante. Hoje, dez meses após o começo do tratamento, não tenho mais esse problema. Faço exames de sangue periódicos, e as taxas hormonais já estão corretas.

Vão-se as espinhas, ficam as cicatrizes
Mas nem tudo é felicidade. Após me livrar das espinhas, no lugar delas sobraram muitos, mas muitos queloides mesmo!
Meu tórax e minhas costas estão forrados de marcas. Passei em uma dermatologista que me recomendou usar (novamente) a pomada-gel Kelo-Cote, mas não vejo diferença alguma.
É impressionante. Foi só eu começar a conviver um pouquinho melhor com o meu queloide e muitos outros apareceram. É como se fosse uma provação, um teste de paciência. Minha vergonha agora é bem maior. Não uso mais tranquilamente uma blusa decotada, nem na frente nem nas costas. Achar um vestido de festa que se adapte às minhas marcas é um suplício! Será que só existe decote tomara que caia neste mundo, meu Deus??? Que saudade da época em que eu tinha uma única cicatriz...

(Atenção: eu não sou médica! Não utilize nenhum medicamento descrito neste blog sem antes passar por uma consulta médica. O que é bom para mim pode não ser para você, e vice-versa. )

Convivendo com o queloide

O início
Em 1997 (aos 13 anos) “surgiu” um queloide no meu tórax. Eu nunca havia ouvido falar sobre isso, e demorei a procurar um dermatologista. Quando procurei, o queloide tinha o tamanho de um grão de feijão. A médica me disse que se eu tivesse procurado tratamento antes, certamente o tratamento seria mais eficaz.
Até hoje não sei o que causou o queloide. Lembro-me que na época, a doutora me disse que alguns queloides são espontâneos. Hoje já se sabe que isso não existe, então creio que ele deve ter surgido por conta de alguma espinha que apareceu e eu não me lembro...
Não sou médica e não sei quais são as probabilidades de uma pessoa desenvolver queloide. Eu já ouvi dizer que pessoas negras e orientais têm mais chances de desenvolvê-los, e que eles ocorrem mais em mulheres e até os 30 anos. Eu não sou negra nem oriental, mas tive essa má sorte...

Tentativas de cura
Após me consultar com a dermatologista eu comecei a usar um adesivo de corticoide (era um adesivo mesmo, não uma placa. Eu não me lembro o nome, mas sei que ele colava na pele e doía demais na hora de retirar) e também fiz infiltração de corticosteroide com a minha dermatologista. A dor que eu sentia em cada aplicação era enorme. No dia da infiltração eu percebia uma melhora na cicatriz, mas no dia seguinte ela já estava alta novamente, doía e coçava (algo que sempre ocorreu, e me incomodava tanto quanto a parte estética).
Desisti do tratamento após umas sete aplicações. Usei algumas pomadas (Contractubex e Kelo-Cote são as que me lembro), mas nunca senti nenhuma melhora.
Por alguns anos eu resolvi esquecer o problema, mas como a cicatriz sempre me incomodou demais, em 2005 eu procurei um cirurgião plástico. Aliás, alguns cirurgiões. Conversei primeiro com a minha dermatologista, e ela disse que poderia haver uma melhora no queloide com a intervenção cirúrgica, desde que logo após eu fizesse pelo menos 10 sessões de betaterapia (espécie de radioterapia mais “light”, que atinge apenas a camada superficial da pele e destrói as células causadoras do queloide). Todos os cirurgiões que procurei disseram que a chance de o queloide “desaparecer” era de 80%. Uhu, vou ficar livre dele! – foi o que pensei. 

A cirurgia
Após escolher o cirurgião que faria a intervenção, descobri que o meu convênio (Blue Life, na época) não cobriria nem a cirurgia nem as sessões de betaterapia, pois consideravam o procedimento estético, mesmo a minha médica tendo feito uma carta explicando que não se tratava de um procedimento estético, mas sim para melhorar a dor e a coceira que sentia. Nada feito! Precisei desembolsar toda a grana do tratamento (chorei um desconto e tudo ficou em torno de R$ 600).
Data da cirurgia marcada, lá fui eu ao consultório médico, feliz e otimista! A cirurgia foi rápida, com anestesia local. Os pontos, internos. Saí de lá e fui direto ao hospital começar a sessão de betaterapia (fiz dez sessões, uma por dia, se não me engano... Não me lembro o nome do local onde fiz, só sei que ficava próximo ao metrô Santa Cruz [SP]).
Alguns dias depois da cirurgia eu precisei usar Micropore. Depois a médica me recomendou que usasse uma placa de silicone, para impedir o desenvolvimento de um novo queloide. Não era fácil encontrar a bendita placa. Quando encontrei, era uma placa enorme, horrível de usar, pois ela não aderia à pele. Hoje em dia há uma ótima, chama-se Medgel (Silimed), mas eu demorei até descobri-la.
Uns quatro meses após a cirurgia+betaterapia já dava para notar o resultado: em vez de me livrar do queloide, ele aumentou. Pois é. E agora ele doía e coçava ainda mais. Dormir era um transtorno, pois sempre que me deitava de lado, a cicatriz ficava “comprimida”, e durante a noite, quando me virava, a cicatriz se “expandia” e a dor era enorme! Foi horrível. Me arrependi demais por ter feito a cirurgia. Não culpo a minha médica de forma alguma. Infelizmente, eu tive o azar de cair nos 20% de chance de a cirurgia não funcionar...

Abaixo, fotos do antes e depois. As fotos estão péssimas, por causa da resolução, mas dá pra ter uma ideia...

                                                    Antes da cirurgia

                                                Depois da cirurgia